domingo, 20 de junho de 2010

Desassossego


Chegaste sem ser convidado. 
Inconveniente, 
entraste alheio aos meus pretextos, que a ti mais pareciam soar a melodia de acasalamento.
Presunçoso,
ignoraste o meu  desagrado perante a tua inesperada presença. 
E com luxuria no olhar, sorriste triunfante à medida que o meu corpo me ia traindo. 
Beligerante e desobediente ganhava vida própria,
desmentia descaradamente a veracidade das palavras que te atirava como setas envenenadas. 
Seguraste-me o braço,
tentei em vão fazer soltar 
e obrigaste-me a olhar-te. 
Inclinaste-te e roçaste-me ao de leve o rosto com teus lábios. 
Abanaste a cabeça em silêncio, e selaste-me os lábios com os dedos, 
como se as minhas palavras finalmente te ferissem. 
Não demorou até perder a noção da realidade.
O fogo das tuas mãos roubou-me a vergonha e o medo. 
Desejei nelas perder-me e não mais regressar.
Embriagada.
Era assim que me sentia. 
Era esse o efeito que tinhas em mim.
Sorriste-me docemente, encorajando-me a perder-me em ti.
As tuas mãos desenharam-me o corpo,
e escreveram na minha pele uma maldição que haveria de me perseguir toda a vida. 
Da mesma forma que chegaste, saíste. 
Teria gostado de voltar a ver-te uma última vez. 
Poder olhar-te nos olhos e dizer-te coisas que não sei como as escrever. 
Desde que desapareceste, 
o tempo tornou-se pesado. 
E cada hora do meu dia repete o vazio da tua ausência.