sexta-feira, 5 de novembro de 2010

O coração da terra bate ao ritmo dos teus passos


Meu amor,

Escrevo-te cartas para contrariar a tendência de já ninguém o fazer. Eram assim que sempre começavam as minhas cartas para ti! 
Lembraste como costumavas espicaçar-me à conta dos meus ideias românticos? Dizias ser a ultima romântica do século XXI e que escrevia cartas de amor apenas para indignar Fernando Pessoa!
As tuas palavras não me impediam de te escrever, tanto que perdi a conta de quantas te escrevi. Apesar de nunca ter tido coragem de perguntar-te, sei que ainda as guardas, fechadas algures dentro de um baú qualquer onde armazenaste tudo o que um dia representou um "nós". 
Tenho-me questionado se depois de mim, alguma outra, que ocupou o meu lugar voltou a escrever-te. Guardo secretamente o desejo masoquista de por tuas mãos não ter voltado a passar uma outra carta de amor. Assim, ao menos continuarei a ser para ti aquela que escrevia lirismos amoroso em papel perfumado.
Por estranho que te possa parecer, depois de ti comecei a achar que Pessoa tinha razão. Agora todas as cartas de amor parecem-me tristemente ridículas. 
Continuo a acreditar num amor antiquado que marcou outras épocas. Num amor que vive-se uma só vez na vida. Num romantismo doentio em que ainda era possível morre-se por um desgosto amoroso.
Num amor como o de Virgílio Ferreira e Sandra, como o de Inês e Pedro, como o de Elizabeth e Mr. Darcy, apenas perdi a capacidade de escrever para outro que não tu.
É ainda estranho ver-te somente como um amigo. Houve um tempo, em que acreditei que envelheceríamos juntos. 
Dar-te por garantido foi o meu maior erro.
Julguei-te meu.  Oh como julguei-te mal.
Não sei dizer-te quando ou porquê comecei a tratar-te como um apêndice que trazia pendurado ao coração.
Podia tentar culpar o tempo. Habituei-me a ti. E usei-te com a mesma certeza de que, tal como o ar que respiro também tu serias ilimitado.
Conduzi-te pela minha mão cega e inconsciente ao abismo de nós, sem me aperceber que ia esgotando um sentimento que presumi infinitamente inesgotável.
Este meu amor, foi o meu 2º maior erro. Esqueci que as presunções são por regra ilidíveis.
Hoje, compreendo com absoluta clareza das coisas inexplicáveis, que as tuas mãos escreveram na minha pele uma maldição que irei transportar comigo até ao fim. E que o prazer que o meu corpo conhece, é o que aprendeu com o teu e é esse prazer que ensino a outros homens, que uso para tentar enganar a ausência de ti.

Até breve**