Olá amigos,
queria que este livro tivesse sido a sugestão literária do mês passado, até porque fez em Outubro 15 anos que Saramago recebeu o Prémio Nobel da Literatura. Infelizmente não o consegui acabar a tempo, motivo pelo qual ficou em falta a minha sugestão mensal literária do mês passado...vá, podem atirar pedras, eu deixo!!
Em relação a este livro, gostei mas ficou aquém das minhas expectativas. Não teve o mesmo impacto em mim que "As Intermitências da Morte", nem me inquietou como em "Caim", nem me tocou pela enorme clarividência como o fez com o "Ensaio sobre a cegueira" ou com o "Ensaio sobre a lucidez".
Ainda assim versando sobre um dos temas primordiais de Saramago, a condição humana, a vida e a morte, maravilhou-me novamente pela ausência de nomes próprios das personagens, tal como em "Ensaio sobre a Cegueira".
Porém, neste livro existe uma excepção, o protagonista, o Sr. José! Os restantes intervenientes do romance são identificado como "a senhora do rés-do-chão", "o pastor de ovelhas", "o marido ciumento" etc.
Este recurso narrativo utilizado por Saramago reforça a universalidade do tema; Sem ter nome próprio a personagem torna-se universal, ou seja, naquela "pessoa" cabe todos e cada um de nós. Abarca indiscriminadamente todo o universo humano. Enquanto que ao se atribuir um nome próprio a uma personagem torna-as únicas, individualizadas. Isto é brilhante!! Algo que nunca tinha pensado até começar a ler os livros deste escritor.
Gostei também de logo no inicio do romance, Saramago chamar a atenção do leitor para o facto de conhecermos o nome que nos deram, mas não conhecermos o nosso verdadeiro nome. Eu explico melhor o que Saramago quer dizer com isto, com esta citação magnifica e que foi a causa de eu ter querido ler este livro:
"... a pele é tudo quanto queremos que os outros vejam de nós, por baixo dela nem nós próprios conseguimos saber quem somos."
Não posso falar por vocês, mas para mim, esta frase é daquelas verdades indiscutíveis e indissociável da natureza do ser humano. Admitamos ou não, tenhamos ou não consciência disso, acredito que deixamos apenas os outros ver o que queremos que eles vejam, passamos o resto do tempo a tentar descobrir quem somos. Quem verdadeiramente somos...
Já me perdi em divagações! A culpa é de Saramago!!! Voltando ao livro, achei a ideia de mudar as placas dos nomes das campas por outros que nada tem a ver com quem de facto lá "mora" bastante interessante. Quanto mais penso nisto, mais sentido faz.
Por muito estranho que pareça, a argumentação do escritor para este comportamento que à partida pareceu-me desrespeitoso e insultuoso, faz muito sentido (deixo isto em aberto para que vocês descubram a justificação quando lerem o livro).
Resumindo, é um bom livro, muito bom mesmo. Apenas não tão brilhante quando esperava.
Sendo justa, isto é porque de Saramago espero sempre ser arrebatada com perspectivas tão diferentes de realidades corriqueiras que nunca, nunca me passaria pela cabeça processa-las daquela forma, todavia, depois de ler a argumentação do escritor, estas passam a fazer todo o sentido... por muito doido que à partida possa parecer!
É justamente isto que me faz adorar a escrita de Saramago, a capacidade de me forçar a pensar. De me questionar. A possibilidade de repensar realidades que tinha como assentes, como indiscutíveis, sob uma perspectiva tão diversa mas ainda assim, tão lúcida que é impossível continuar a encarar as
mesmas da mesma forma. Isso para não falar do sentido de humor deste homem... tão finamente sarcástico que é um deleite para quem gosta deste tipo de humor.
Para terminar (que este post já vai demasiado longo) se nunca leram Saramago, não comecem por este. Mas se são apreciadores da escrita deste grande senhor, sugiro uma considerável dose de persistência... é que este obriga a uma certa ginástica mental!
Espero que gostem,
Até breve**